Bate-papo: 1º ano do Ensino Fundamental: O quê? Como? Por quê? (30/01/2008)
1º ano do Ensino Fundamental: O quê? Como? Por quê?
A Lei 11.274, de 2006, tornou obrigatória a inclusão de um ano a mais no Ensino Fundamental. Com essa ampliação, milhões de brasileiros estão freqüentando mais cedo as salas de aula. Vários professores ainda se adaptam a essa realidade e têm dúvidas quanto ao que trabalhar com os pequenos. Por isso, o EducaRede convidou a professora Beatriz Gouveia, coordenadora do programa Além das Letras, para conversar com os internautas a esse respeito.
Conheça nossa convidada: Beatriz Bontempi Gouveia é pedagoga e consultora na área de alfabetização. Participou da elaboração e implementação do Programa de Formação de Professores Alfabetizadores PROFA, do MEC, e hoje coordena o programa Além das Letras, do Instituto Avisa Lá.
Bia Gouveia : Olá! Gostaria de agradecer o convite para este bate-papo. Espero que seja mais um espaço de reflexão para esta questão tão importante como os conteúdos de ensino e as possibilidades de aprendizagem para o primeiro ano.
Janaina diz: Oi, Bia! Queria saber a sua opinião quanto à alfabetização dos alunos.
Bia Gouveia : Janaína, o primeiro ano passa a significar mais oportunidades de os alunos participarem de alguma forma de práticas sociais mediadas pela escrita. Não significa que sejam alfabetizados ao final do primeiro ano.
Bia Gouveia : Janaína, a questão que rodeia a alfabetização é se deve ou não concluir o processo de alfabetização aos 6 anos. Sabemos que o primeiro ano oferecerá mais oportunidades de aprendizagem para os alunos, será o início de um processo que tem como princípio participar de práticas sociais de leitura e escrita.
Carlos diz: Professora Beatriz, boa noite. As orientações para a inclusão da criança de 6 anos no Ensino Fundamental publicadas pelo MEC, em 2006, afirmam, logo em sua introdução, à página 11, que "é preciso, ainda, que haja, de forma criteriosa, com base em estudos, debates e entendimentos, a reorganização das propostas pedagógicas das secretarias de educação e dos projetos pedagógicos das escolas..."
Bia Gouveia: Carlos, implica reorganização da escola, mas é uma mudança importante e oportuna porque significa mais um ano de vida escolar para os alunos, significa mais oportunidades de aprendizagem e de boas experiências educativas. A baliza da mudança nas escolas é se debruçar sobre quais são as boas experiências de ensino e aprendizagem que as crianças podem ter.
Cleiton diz: Sobre sua resposta à Janaína, há alguma recomendação do MEC quanto a isso? Se elas "não" devem ser alfabetizadas?
Bia Gouveia : Cleiton, a recomendação do MEC não é que devem ser alfabetizados, mas que a escola deve oferecer boas experiências com leitura e escrita. Para a população de alunos que vem de famílias pouco escolarizadas é essencial que tenham a oportunidade de vivenciar na escola práticas sociais de leitura e escrita: que escutem histórias, que tenham acesso à diversidade de textos, que esses textos sejam lidos para elas, que tenham acesso à escrita nas suas diferentes funções sociais. Vejam: uma criança que começa o processo de aprendizagem aos 7 anos e precisa estar alfabetizada aos 8 vive uma experiência muito diferente de quem começa aos 6 e tem mais tempo para concluir.
renatinha diz: Devemos seguir o currículo da pré-escola para trabalhar com essas crianças?
Bia Gouveia: Renatinha, matriculadas na Educação Infantil ou no Ensino Fundamental, as necessidades e possibilidades das crianças de 6 anos continuam as mesmas. Se é uma experiência inédita para a escola receber crianças de 6 anos, não se deve transferir os conteúdos e atividades da tradicional primeira série, mas conceber uma nova estrutura de organização dos conteúdos considerando o perfil e as necessidades dos alunos. A organização do espaço e do tempo precisa balancear atividades que as atendam.
Francisca diz: E as brincadeiras? Com que periodicidade devemos promovê-las?
Bia Gouveia: Francisca, as brincadeiras são fundamentais para a rotina das crianças de 6 anos. Por isso precisam ser incluídas no tempo e no espaço, considerando as brincadeiras simbólicas, os jogos de construção, as brincadeiras que incluem movimento, os jogos de regras...
Bia Gouveia: Francisca, uma sugestão: no mínimo 3 vezes por semana. No mínimo.
lele diz: Boa noite, Beatriz. Você acha que crianças do primeiro ano têm condições de aprender a tabuada?
Bia Gouveia: Lele, penso que há outras experiências com os números e o sistema de numeração mais interessantes e pertinentes para o primeiro ano. Há uma série de jogos que promovem bons desafios sobre números, sistema de numeração, contagens, cálculos, leitura e escrita de números. A sugestão é propor desafios sobre as operações matemáticas e o sistema numérico mais adequados ao conhecimento do grupo. Ter como hipótese de trabalho a tabuada para o primeiro ano não me parece adequado. É como se estivéssemos passando por cima de questões de base.
lele diz: Qual é o conteúdo de matemática que deve ser trabalho com essas crianças?
Bia Gouveia: Lele, acho que já respondi parte de sua pergunta na questão anterior. Gosto das orientações propostas no Referencial Curricular de Educação Infantil e nos PCNs, que propõe pensar a área de matemática por eixos. Basicamente, propõem-se atividades sobre o sistema de numeração, o espaço e forma, as operações, e há uma valorização dos jogos como ótimos espaços para trabalhar e propor os conteúdos.
juli@_paula diz: Boa noite. Com quantos anos as crianças devem entrar no primeiro ano? Em 2007, na sala em que lecionamos, chegaram crianças que completaram 7 anos no primeiro semestre de 2007. Isto é certo?
Bia Gouveia: juli@-paula, a sua escola é publica ou privada? Eu fiz esta pergunta porque a lei fixa como condição de matrícula que a criança tenha 6 anos completos ou a completar no início do ano letivo em curso. Há escolas privadas que recebem crianças no primeiro ano que completam 6 anos apenas no final do ano letivo. Ou seja, o critério é que completem 6 anos naquele ano, não importando em que mês.
Marcela diz: Você sabe se essa mudança na Lei já chegou à maioria das escolas do país? Ou são poucas escolas que já adotaram o ensino fundamental de nove anos?
Bia Gouveia: Marcela, foi em fevereiro de 2006 que a lei foi instituída para o ensino fundamental de 9 anos de duração com a inclusão das crianças de 6 anos. Desde então a informação e as notícias são de que as escolas estão se reorganizando para atendê-las. Pelo que sabemos, já chegou à maioria das escolas.
roberto diz: Boa noite! Meu filho tem 5 anos e completa 6 em abril. A escola informa que ele deve fazer a fase III do jardim. Você acha que ele deve ficar no jardim ou ir para o primeiro ano?
Bia Gouveia: Roberto, seu filho já está na Educação Infantil e, nesse caso, sugiro que converse com a direção da escola atual e da que ele irá para cursar o Ensino Fundamental porque há a questão das vagas e dos procedimentos adotados pelas escolas. Pela lei, seu filho pode cursar o primeiro ano neste ano, mas pode haver uma interpretação da escola desconhecida por nós. Se o seu filho estiver muito bem na escola em que está, e se não houver nenhum problema em ele ir direto para o segundo ano do Ensino Fundamental, ele pode ficar onde está.
Bia Gouveia: Roberto, nessa situação, cabe avaliar a situação de vagas para o próximo ano e a boa experiência que ele tem na escola atual.
juli@-paula diz: A escola em que lecionamos é publica. Então, crianças que completam 7 anos no início do ano devem ir para o segundo ano?
Bia Gouveia: juli@-paula, é isso mesmo. Se as crianças completam 7 anos no início do ano devem ir para o segundo ano.
Roberto diz: Obrigado.
Carlos Henrique diz: Professora Beatriz, boa tarde. As orientações para a inclusão da criança de 6 anos no Ensino Fundamental publicadas pelo MEC, em 2006, afirmam, logo em sua introdução, à página 11, que "é preciso, ainda, que haja, de forma criteriosa, com base em estudos, debates e entendimentos, a reorganização das propostas pedagógicas das secretarias de educação e dos projetos pedagógicos das escolas". Podemos imaginar que, no plano ideal, seus formuladores imaginaram, à época, que a partir dessa publicação todas as cidades brasileiras se entregariam (ainda que gradativamente) a esses estudos, debates e entendimentos, coordenados por seus gestores e conselhos locais. Contudo sabemos que a realidade é outra. Em nossos municípios, grosso modo, os maiores interessados (profissionais e, notadamente, pais e alunos) não conhecem (e, pior ainda, nem sabem onde estão disponíveis) as propostas pedagógicas das SMEs, o que inviabiliza a participação efetiva desses segmentos nas tão desejadas reelaborações dos projetos pedagógicos. Apenas os professores participam, ainda que enfadados, das desinteressantes semanas de planejamento que, na prática, resumem-se a copiar o planejamento do ano anterior... (continua)
Bia Gouveia : Carlos Henrique, entendo o seu desabafo e compartilho da indignação em relação à forma como estas orientações são apresentadas. No entanto, sempre penso nos alunos que ganharam mais um ano na vida escolar, que poderá incluí-los mais nas práticas sociais de leitura e escrita. As crianças de 6 anos provenientes de classes mais favorecidas ingressam na escola bem antes dos 6 anos. Minha sugestão é buscar no próprio portal do MEC as orientações para a inclusão das crianças e mobilizar a sua equipe de trabalho para promover estudos e reflexões. Os Referenciais de Educação e os PCNs podem ajudar a pensar na elaboração de um currículo de 6 anos.
Bia Gouveia : Carlos Henrique, compartilho da crítica em relação às semanas de planejamento. A experiência tem mostrado que as mudanças são promovidas quando há uma estrutura permanente de formação nas escolas, em que os coordenadores e professores se debruçam sobre sua prática, articulando os novos estudos aos seus contextos de trabalho.
Outro diz: Sou professora do primeiro ano em uma escola publica. A direção da escola quer todos os alunos alfabetizados até o final do ano. Eu acho que deveríamos levar em conta o tempo de cada aluno. O que você acha?
O papo está muito bom, mas precisamos terminar.
Bia Gouveia: estar alfabetizado significa ler com autonomia e ter compreendido o funcionamento do sistema alfabético. Uma criança que começa o processo de aprendizagem aos 6 e precisa estar alfabetizada aos 7 é muito diferente daquela que inicia aos 6 e pode estar alfabetizada aos 8. É um tempo precioso para viver boas experiências com leitura e escrita.
Chegou a hora de encerrar. Beatriz, você pode se despedir?
Bia Gouveia : além de não ter esta meta tão enrijecida no primeiro ano, é preciso considerar os diferentes saberes que os alunos apresentam aos professores.
Bia Gouveia: Agradeço às perguntas que promoveram mais um espaço de reflexão e discussão para esta questão essencial. Desejo um ótimo ano de trabalho a todos!
Agradecemos a participação de todos neste bate-papo!
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